O consumidor brasileiro entendeu há algum tempo que a internet seria uma grande aliada na hora de fazer compras. Seja para comparar preços, seja para listar os melhores produtos ou realizar a compra de fato, essa relação vem amadurecendo cada vez mais. Estamos falando de compradores mais conectados e atentos às melhores oportunidades – não somente de preço, mas também de outros atributos, como confiança nas marcas, facilidade e conveniência na hora de comprar.
Nenhum outro evento no ano demonstra isso melhor que a Black Friday – uma data que, em menos de dez anos, mudou os hábitos de consumo do país de maneira única, transformando sazonalidades, gerando planejamento e aumentando o peso do digital na vida do consumidor.
Neste artigo, vamos colocar em contexto os grandes papéis da Black Friday no Brasil. Vamos usar dados para mostrar como ela se insere no ano do brasileiro e trazer ideias de como as marcas podem criar relacionamentos mais relevantes com os clientes.
Época de felicidade e prosperidade
A Black Friday está situada em um período do ano, de setembro a janeiro, em que a atmosfera está repleta de alegria, riqueza, expectativa pelas férias e indulgência.
Esse espírito sem dúvida se reflete em uma temporada de consumo: a intenção histórica de compra no país sobe 2,5% ao mês entre setembro e o fim do ano.
Essa intenção aumenta por dois motivos, e o primeiro é financeiro. Nesse período, há um aumento de renda real para os brasileiros, subindo 1% ao mês a partir de setembro – ou seja, há mais dinheiro no mercado. As razões para isso são: mais emprego, pois esse é um período em que mais vagas temporárias são abertas; maior oferta de crédito; e a injeção de dinheiro na economia causada pelo 13º salário.
O segundo motivo é emocional. Setembro marca a chegada da primavera, quando os dias ficam mais quentes e as pessoas, mais felizes. Isso é algo que os dados comprovam: nessa época do ano, o Brasil registra uma queda nas buscas online que sinalizam negatividade no humor, como “depressão”, “terapia”, “tristeza” etc.
Esses dois fatores somados levam a um consumo mais permissivo com nós mesmos, com o sentimento de merecimento e a vontade de aproveitar os frutos de nove ou dez meses de trabalho ao longo do ano. É nesse período que as buscas por termos que indicam um consumo mais funcional caem, enquanto sobem as que indicam hedonismo, ou um consumo mais emocional.
Se pensarmos no contexto financeiro e emocional das pessoas ao longo do segundo semestre, veremos que sua disposição para consumir aumenta progressivamente – e setembro marca a abertura dessa temporada.
Historicamente, a única data comercial que tínhamos no Brasil no segundo semestre era o Natal. No entanto, ele traz alguns problemas: demora muito para chegar – ocorrendo apenas na reta final desse contexto de consumo – e é uma data voltada aos outros, com a compra de presentes, e não para si próprio - e o mesmo ocorre com outros momentos, como Dia das Mães, dos Pais e dos Namorados.
Assim, a Black Friday não é só uma invenção do varejo: ela concretiza uma aspiração humana. Essa é a primeira vez que temos um pretexto comercial nos oferecendo vantagens para justificar impulsos de consumo que já existiam contextualmente. Essa data funciona como o grande portal de uma temporada de consumo, o momento em que o hedonismo típico daquele período se transforma em vendas.
O portal de uma temporada inteira
Com esse pensamento em mente, vamos falar de quatro papéis da Black Friday no Brasil. O primeiro é o que citamos acima: ser portal de uma temporada de consumo.
Em termos de dimensões e números, podemos dizer que o normal da Black Friday no Brasil é superar expectativas ano a ano. Em 2018, por exemplo, a previsão era de 15% de alta no faturamento em relação a 2017, mas o número chegou a 23%.
Além disso, o ticket médio cresceu 8%, para R$ 608 em vendas online, um valor razoavelmente alto para os padrões do país.
Outro dado sobre o tamanho da Black Friday é que 70% dos brasileiros conectados já compraram algo na data – uma proporção impressionante, já que a penetração da internet no país fica abaixo de 70%. Já o awareness da Black Friday é quase absoluto.
Como já falamos, as datas de varejo no Brasil costumam valorizar o outro, com a compra de presentes. Mas na Black Friday, 78% das pessoas compram produtos ou serviços para elas mesmas – o que mostra como ela quebra a lógica tradicional.
A Black Friday sempre tem uma “primeira vez”
Com tantos números gigantescos, chegamos ao segundo papel da Black Friday, que é aumentar a penetração das categorias, propiciando muitas “primeiras vezes”. Vamos ver alguns dados que comprovam isso.
Entre a classe C, 78% das pessoas já estavam esperando desde setembro a Black Friday pra comprar algo que poderiam ter adquirido antes. A data é um trampolim essencial para as pessoas cujas aquisições são conquistas difíceis. Esse é um dado que nos leva a pensar que boa parte dessas compras serão uma “primeira vez” na Black Friday para muita gente.
Com isso, a data traz a oportunidade de expandir categorias nichadas incluindo clientes novos – em 2018, por exemplo, 46% das pessoas que compraram pacotes de turismo com passagens aéreas nunca havia viajado de avião antes.
Além de expandir categorias, a Black Friday consolida o digital como grande canal de transação. Em 2019, 12% dos que pretendem consumir na data vão comprar online pela primeira vez – serão 8 milhões de brasileiros que vão descobrir o comércio digital. A cada Black Friday, o digital ganha novos degraus de importância como canal de transações no país, já que são suas vantagens que levam o consumidor mais receoso a tomar coragem e fazer sua primeira compra online.
Esse momento não é feito só de pessoas entrando em categorias novas, mas também experimentando novas marcas. No varejo, oito em cada 10 pessoas querem usar a Black Friday para comprar em lojas diferentes do que costumam comprar. Já em categorias como serviços de assinatura e veículos, quase metade dos consumidores pretende conhecer ou aproveitar ofertas de novas marcas na data.
E essa proporção é vista mesmo no setor de serviços, onde as relações são construídas lentamente e ao longo do tempo (ex: bancos e agências de viagem). É como se o lema da Black Friday fosse “ninguém é de ninguém”. Ela funciona como uma grande feira, em que produtos e serviços são oferecidos ao público aberto a transitar e a conhecer novas marcas.
Encontrando saídas para reforçar a marca
Por outro lado, esse dia de experimentação também é um momento para proteger nossos clientes. É preciso ter estratégias de retenção, lembrando as pessoas de por que elas devem continuar com você. A Black Friday é um dia em que o trânsito dos consumidores acontece ancorado nas marcas: os termos contendo nomes de marcas têm o maior crescimento na data, um aumento de mais de 40% nas buscas na própria sexta-feira, enquanto as buscas com termos sem nomes de marcas crescem apenas 4%.
Pensando de novo em uma feira, é como se todas as marcas estivessem na Black Friday com seus cartões de visita, se apresentando a consumidores novos, contando quem elas são e qual é sua proposta na data. Assim, se as pessoas buscarem pelas marcas, vão cair na sua homepage; e ela precisa estar muito bem editada para responder duas perguntas: do que trata a apresentação da sua marca? E quem sou eu na Black Friday?
Falando em atributos, o preço ainda é uma variável muito relevante para quem consome: é o mais importante para 46% das pessoas este ano. Mas 43% delas acharam as ofertas do ano passado parecidas umas com as outras, o que reduz a relevância das promoções. Além disso, 45% acharam os anúncios similares e sem originalidade em 2018 – a maioria com fundo preto e textos em cores berrantes.
Com tudo isso, vemos que é fácil as ofertas caírem na mesmice e perderem peso. É importante saber que o preço é, antes de tudo, uma premissa: é algo de que toda loja e marca precisa para entrar na Black Friday. E então outras variáveis entram em jogo.
Quando se desconsidera o preço, o atributo mais relevante para os consumidores é a confiança, seguida pela boa reputação. Isso reflete um tempo em que a Black Friday era chamada de “Black Fraude”, com ofertas vistas pelo público como enganadoras.
Para ganhar a confiança do cliente, tente contar com um ecossistema que confirme sua reputação, como ter um bom retrospecto no Reclame Aqui, por exemplo.
O momento certo para experimentar
Ora, se estamos falando de um dia para se apresentar a novos clientes e gerar experimentação, fica fácil chegar ao terceiro papel da data: um dia de Construção de Marca.
A Black Friday é tão importante que mudou a sazonalidade de quase todas as categorias, universalizando o momento de compra. Há dez anos, por exemplo, o pico de vendas de geladeiras era perto do verão, quando a família voltava de férias e avaliava o que era preciso para renovar na casa. Já as passagens aéreas eram compradas bem mais perto do momento programado da viagem, enquanto os celulares tinham uma concentração de buscas e vendas quando um novo modelo era lançado. Mas, hoje em dia, os picos dessas três categorias ocorrem em novembro. Nos programamos para comprar celulares, geladeiras, passagens, televisões e roupas em novembro! Nunca uma data foi tão poderosa para pautar quando iríamos adquirir bens tão diferentes.
Esse planejamento é voltado também para uma diversidade maior de consumo: este ano, as pessoas pretendem comprar em 6,5 categorias, contra 4 em 2018, e 87% delas planejam consumir em mais de uma categoria.
Além disso, cada categoria tem uma expectativa diferente. Quando pensamos em âncoras da data, lembramos de smartphones, eletroeletrônicos e computadores, mas as categorias menos comuns são as que mais crescem em vendas ano a ano, entre 200% e 300%, como serviços financeiros, viagem, automóveis e até imóveis.
A satisfação com o apoio na hora
O quarto e último grande papel da Black Friday no Brasil é ser uma data em que as transações significam satisfação.
Lidar com expectativas é sempre uma grande responsabilidade. Quando pensamos numa relação entre consumidores e marcas, que hoje é fortemente baseada em eliminar as fricções, essa responsabilidade é maior ainda. É preciso garantir que essa transação seja bem-sucedida, tanto na venda como no pós-venda, para que tenhamos chances de conquistar esse consumidor com quem tivemos nosso “primeiro encontro”.
Precisamos ter em mente que quando falamos de Black Friday no Brasil não estamos apenas falando de uma data de ofertas, mas de um dia que significa a oportunidade de sentir que um ano inteiro de trabalho valeu a pena. Esse sentimento de catarse tão importante e raro passa pelas mãos de todos nós comerciantes, publicitários e empresários durante a Black Friday.
E tendo isso em mente, todos os timings de compra nessa temporada são importantes. Antes de consumir, por exemplo, é fundamental ter atenção ao aumento das dívidas das pessoas, que normalmente precisam de ajuda para se organizar.
Essa preparação exige um consumo enorme de informação. Os produtores de conteúdo que trazem dicas sobre compras em blogs, sites ou canais do YouTube veem um pico considerável de acessos em outubro, o principal mês de planejamento.
Consumo de conteúdo de recomendação no YouTube
O que isso mostra? Que a busca das pessoas por educação financeira não tem como motivação as razões clássicas, como pensar no futuro, mas sim uma necessidade de curto prazo. Se elas buscam essas informações em outubro, é porque querem estar aptas a consumir em novembro, a tempo de aproveitar a Black Friday.
Nesse cenário, os serviços financeiros podem ser um grande pilar de apoio. Quando perguntamos às pessoas o que elas esperam das instituições financeiras na Black Friday, quase 80% delas dizem esperar algo. Já foi uma surpresa entender que apenas 20% dos entrevistados não esperavam nada dos bancos, mas mais surpreendente ainda foi entender que uma das respostas que mais apareceu foi a palavra “Ajuda”. Quando entendemos o gap entre a situação financeira das famílias brasileiras e a dimensão que tem a Black Friday como um dia de realizar sonhos, fica mais fácil visualizar as empresas que cuidam do nosso dinheiro como os potenciais catalisadores a quem se pede socorro. Seja para entender como ficar em dia com as contas, seja para resolver as pendências, ou, ainda, de fato conseguir mais crédito, são os serviços financeiros os únicos capazes de prover acesso a esse dia para tantas pessoas.
O poder de uma temporada
Com todos esses dados e informações, fica muito claro o poder da Black Friday no Brasil hoje. Essa é uma data que mudou hábitos de consumo, sendo o ponto alto de uma temporada de compras que se encaixa perfeitamente nos anseios dos brasileiros.
Para as pessoas, a Black Friday as leva ao planejamento das compras, ou então ao mundo novo do comércio online. Para as marcas, ela é a maior oportunidade para experimentar novas abordagens, retendo clientes antigos, conquistando novos consumidores e mantendo relações que vão durar por tempos depois da compra.
Trabalhar com os dados e entender melhor como o brasileiro enxerga a Black Friday e os papéis que ela tem: esse é o caminho para o sucesso não só em 2019, mas nas Black Fridays que vêm por aí.