À primeira vista, a sul-coreana RuiCovery se parece com qualquer outro criador que posta covers de músicas no YouTube. Mas há uma diferença-chave que a distingue: Rui é interpretada por uma atriz que usa um rosto gerado por inteligência artificial, projetado pela startup de tecnologia Dob Studio, sediada em Seul.
O sucesso de Rui é um sinal de que estamos vivendo um momento crucial de transformações na tecnologia, na criatividade e na cultura — e que a IA é apenas uma parte disso. Essa é uma mudança que atinge tanto os criadores casuais quanto aqueles com habilidades técnicas avançadas, e que resulta em mais oportunidades criativas — e em novas formas de engajar a audiência com o conteúdo.
Para entender melhor esse cenário de transformação na criação e no consumo de vídeos, analisamos centenas de tendências, conversamos com criadores e especialistas, e fizemos pesquisas em 14 países. O resultado é o relatório YouTube Culture and Trends 2023, que vai ajudar profissionais de marketing a captar onde está a cultura do vídeo hoje, para onde ela está indo e como prosperar no ambiente digital.
Tendência #1: a Geração Z está diminuindo a distância entre os criadores e a audiência
O surgimento de comunidades online de fãs teve um impacto enorme na cultura pop, mas em 2023, graças à disponibilidade de ferramentas avançadas, elas têm o papel ativo de moldar a cultura como jamais tiveram. A eclosão de fandoms adicionou várias camadas a esse universo e mudou não apenas a maneira como as pessoas participam da cultura do vídeo, mas como elas percebem sua função nesse ambiente. De acordo com uma pesquisa conduzida pela Ipsos em 14 países, 41% da Geração Z se descreve como criadora de conteúdo.1 Dos criadores de memes aos comentaristas, passando pelos fãs profissionais que têm, eles mesmos, seguidores dedicados, os Gen Z têm uma oportunidade sem precedentes de influenciar o que amam.
O diretor Kane Parsons, de 17 anos, experimentou isso quando os fãs do seu curta, "Backrooms", criaram tantos vídeos analisando e brincando com o trabalho dele — há até uma recriação no Minecraft — que o filme alcançou mais de 49 milhões de visualizações e entrou para a lista dos vídeos "Em alta" do YouTube. O sucesso foi tamanho que a produtora A24, responsável pelo longa "Moonlight: Sob a Luz do Luar" e pela série "Euphoria", notou seu talento e o convidou para dirigir um longa-metragem, que deve entrar em cartaz em breve.
O YouTube dá a oportunidade para comentaristas e fãs profissionais contribuírem com suas perspectivas originais sobre as obras de artistas. O músico Lucas Vinícius, por exemplo, faz sucesso ao unir várias canções de um mesmo artista e criar algo completamente novo. E esse é, definitivamente, um conteúdo que o público tem vontade de consumir: nos últimos 12 meses, 47% dos Gen Z assistiram a vídeos feitos por fãs de conteúdos específicos, artistas ou figuras públicas.2
As marcas também se beneficiam dessas comunidades. Recentemente, centenas de criadores postaram no YouTube suas versões do anúncio “Whopper, Whopper”, do Burger King. Os memes e remixes geraram mais de 100 milhões de views em vídeos que se relacionavam de alguma forma com a música, uma onda que ainda seguia forte seis meses depois que o anúncio foi ao ar.3
Tendência #2: Para se destacar, aposte em multiformatos
Seja procrastinando no celular, assistindo à transmissão ao vivo do mundial de futebol, ou ouvindo seu podcast favorito, o público hoje quer — e espera — que a experiência de visualização seja personalizada. Na verdade, 71% da Geração Z afirma gostar da conveniência de assistir a diferentes formatos de vídeo em apenas uma plataforma.4 A flexibilidade da criação multiformato permite que as pessoas possam seguir seus criadores favoritos em todas as telas. E, agora, estamos vendo marcas e criadores que sabem aproveitar essa tendência.
Campanhas que usaram dois ou mais formatos de vídeo tiveram maior probabilidade de conseguir ad recall e brand awareness do que aquelas que utilizaram apenas um.
O criador Casimiro Miguel acumula mais de 8,6 milhões de inscritos no CazéTV, canal criado para a transmissão de jogos de futebol. No mundial Sub-20 deste ano, o público pode acompanhar os jogos e os resultados nos mais diferentes formatos. Uma mesma partida da seleção brasileira, por exemplo, foi transmitida ao vivo, depois foram disponibilizados vídeos com os melhores momentos, e até Shorts de lances específicos. A pesquisa mostra que essa é uma estratégia interessante: nos últimos 12 meses, 87% das pessoas já assistiram a pelo menos quatro formatos de conteúdo oferecidos pelo YouTube.5
Essa mudança de comportamento é uma boa notícia para as marcas que querem alcançar mais espectadores e criadores no YouTube, mas não é a única razão para considerar vários formatos. Hoje, há mais opções do que nunca de aparecer em todas as telas que as pessoas assistem. As ferramentas do Google baseadas em inteligência artificial, como as campanhas de alcance de vídeo, ajudam os profissionais de marketing a criar um mix de formatos de anúncios que alcançam mais pessoas e geram resultados melhores e com maior custo/benefício. De fato, campanhas que usaram dois ou mais formatos de vídeo tiveram maior probabilidade de conseguir ad recall e brand awareness do que aquelas que utilizaram apenas um.6
Tendência #3: novas ferramentas empoderam os usuários a personalizar o conteúdo — inclusive o deles mesmos
A crescente variedade de ferramentas de criação disponíveis hoje ajuda os usuários a remixar áudio e vídeo, adicionar filtros, experimentar efeitos especiais, entre outras ações, o que faz com que a criação de conteúdo se torne parte da cultura popular. A opção de compartilhar clipes de vídeos mais longos do YouTube, por sua vez, se tornou tão comum para os criadores profissionais e casuais que, em 2023, mais de 14 milhões de vídeos foram criados mensalmente usando essa ferramenta.7
Criadores que testaram vídeos dublados em vários idiomas observaram que mais de 15% do tempo de exibição veio de visualizações em outras línguas.
Recursos interativos, como legendas ao vivo e áudio em vários idiomas permitem que as audiências customizem as experiências de visualização, de acordo com suas preferências. Os criadores têm usado as legendas de formas inovadoras: para acrescentar contexto, fazer piadas internas, ou apenas entregar easter eggs para os espectadores interessados. As legendas também contribuíram para o surgimento de "silent vlogs" — vlogs silenciosos em português —, que usam os letreiros para fazer comentários sem quebrar o efeito imersivo do vídeo. Não apenas os usuários estão abertos a assistir a vídeos sem som, mas conteúdos com "silent vlog" no título reuniram 24 milhões de visualizações em 2022.8
Enquanto isso, a ferramenta de áudio em vários idiomas permite que qualquer pessoa faça o upload de diferentes faixas de som no mesmo vídeo. Essa opção abre um mundo de possibilidades para os criadores, marcas e usuários que querem alcançar audiências mais amplas. O criador com mais inscrições da plataforma, Mr. Beast, compartilhou recentemente como dublou seus vídeos mais populares em 11 línguas para atender a uma parcela maior de sua audiência internacional. Criadores que testaram vídeos dublados em vários idiomas observaram que mais de 15% do tempo de exibição veio de visualizações em outras línguas.9
Recentemente, o canal Manual do Mundo adicionou uma faixa em inglês a alguns dos seus vídeos. Essa é uma inovação que as pessoas apoiam: 54% dos entrevistados na pesquisa disseram que seguem um criador que produz conteúdos em um idioma diferente do seu.10 Para as marcas, faixas dubladas podem ajudar a alcançar novos públicos sem que sejam necessários orçamentos de produção gigantescos.
Tendência #4: Público mais amplo está se aproximando da IA graças aos criadores
As ferramentas de inteligência artificial estão democratizando a produção de vídeo ao reduzir o tempo, o treinamento e os custos necessários para que os criadores deem vida às suas visões. Um exemplo disso é o canal Corridor Crew, que usou IA para criar e disponibilizar uma técnica de código aberto que anima qualquer imagem.
Ao colocar o poder de inovar nas mãos dos usuários, permite-se que ideias mais complexas sejam executadas em uma velocidade muito maior, possibilitando que haja momentos de troca entre as pessoas. Isso se revela na forma como os fãs usam IA para criar mash-ups que reimaginam e celebram marcos culturais populares — como, por exemplo, aplicando o icônico estilo do diretor Wes Anderson a sequências de ficção científica. E a audiência é receptiva a esses experimentos criativos: 60% afirmam que estão abertos a assistir a criadores que usam IA para criar conteúdo.11
Momentos gerados por inteligência artificial repercutem porque os criadores conseguem aplicar suas perspectivas únicas para dar vida a conceitos para seus espectadores. Para alguns, isso pode significar, por exemplo, recorrer à tecnologia para obter sugestões criativas, como descobrir uma rotina de maquiagem. Artistas musicais, por sua vez, podem criar elementos visuais para suas faixas, permitindo que os fãs experimentem seus trabalhos de novas maneiras. Esses casos inovadores servem como um modelo de como as ferramentas de IA podem ser usadas no futuro, e ajudam a desmistificá-las para audiências maiores: vídeos sobre ferramentas de IA generativa tiveram mais de 1,7 bilhão de visualizações no YouTube neste ano.12
De criadores com feições geradas por inteligência artificial a bandas com clipes também criados por IA, a cultura do vídeo está se movendo para um cenário mais democrático. E isso está acontecendo rápido. Há mais apetite entre os usuários para trabalhos interessantes, que rompem barreiras, e que sejam acessíveis em todos os devices — e em diferentes idiomas. Além disso, está mais fácil começar e há mais espaço para colaborações, por isso criadores, audiências e marcas têm mais oportunidades para interagir e moldar o futuro do vídeo digital neste caminho.