David Mattin é especialista em comportamento de consumo, conselheiro do Fórum Econômico Mundial e criador da newsletter New World Same Humans. Em sua palestra no evento Google Conecta, o britânico revela quatro grandes oportunidades de negócios para a temporada de sazonalidades no segundo semestre.
Você já deve ter notado que há uma transição acontecendo em relação aos consumidores, devido ao cenário econômico no Brasil e no mundo. É importante observar que momentos de grande transformação fazem com que as necessidades mudem, e os hábitos também. E são em períodos assim que novos comportamentos de consumo surgem, porque se torna necessário criar maneiras distintas de atender as pessoas. Tal contexto apresenta oportunidades que devem ser valorizadas.
Ou seja, ao mesmo tempo que há hesitação e dúvida, há também uma demanda por transformações, seja na cultura, seja no posicionamento, seja na experiência oferecida pelas empresas. E a época de sazonalidades, que acontece no último trimestre do ano, é uma ocasião estratégica para as marcas fortalecerem o contato com os consumidores com quem já têm um relacionamento, mas também de saírem em busca de novos parceiros.
Neste artigo, vou apresentar quatro oportunidades para sua empresa se conectar, atender e construir novos relacionamentos com os consumidores nos próximos meses, que levam em conta a estratégia de comunicação, mas principalmente um posicionamento da marca em tempos de transformação.
De 2020 para cá, tudo o que vivemos foi muito estranho, para dizer o mínimo. Falamos muito em reconfiguração, aprendemos sobre fragilidade. Fomos lembrados repetidamente de como tudo pode falhar, incluindo os sistemas sociais, a economia global e também as cadeias de suprimentos globais.
Os consumidores estão hoje em busca de apoio e de formas para melhorar sua autoestima e saúde – tanto física quanto mental. Eles precisam se recuperar da pandemia, melhorar aspectos de si mesmos e estar preparados para adversidades que podem vir adiante. Esse exercício de adaptação depois de uma mudança significativa é o que chamamos de resilience training — treinamento de resiliência, e se coloca como uma oportunidade para as marcas atenderem os clientes de outras maneiras e construírem diferentes relacionamentos com eles. Vamos olhar para três dimensões de resiliência, que classifico como: comunidade, habilidades e bem-estar.
Os consumidores estão procurando maneiras de melhorar a resiliência de suas comunidades, ao melhorar a eficiência de suas redes de contato, recursos e pessoas ao seu redor. Nesse sentido, entender de que forma os instrumentos do seu negócio podem ser direcionados para impulsionar sua comunidade, seu bairro ou sua cidade é fundamental. Há projetos ou campanhas na sua região que precisam de ajuda? Quais são os desafios da sua vizinhança?
Outro ponto importante é refletir de que forma a sua organização pode fomentar algumas competências — e habilidades — entre os consumidores. As pessoas estão em busca de conhecimentos que possam ajudá-las nesses tempos tão complexos — e talvez você possa apoiá-las nisso.
Vale destacar também que saúde mental e bem-estar são um grande tema. Apenas em 2020, no primeiro ano da pandemia, houve um aumento global de 25% a 27% em depressão e ansiedade.1 Às empresas cabe dar atenção a esses números e entender a urgência de ações nesse campo.
Como você pode contribuir? Um exemplo é criando acesso a terapias conversacionais e de meditação para seus funcionários — e para a comunidade como um todo. Gestos assim refletem positivamente dentro da empresa e na forma como ela é vista externamente dentro da indústria.
O mundo conectado é um mundo transparente. Até pouco tempo atrás as empresas eram como uma caixa preta: cheias de segredos, ninguém conseguia ver dentro delas — e a sua marca era o que você pintava do lado de fora da caixa.
Hoje isso não funciona mais. As pessoas esperam que os negócios sejam como “glass boxes” — caixas de vidro, nas quais elas possam ver o que está por dentro: seus processos, valores, a maneira como trabalham, tudo deve estar exposto. Isso faz com que a cultura da sua empresa seja a marca dela, aquilo que a define. Por isso é preciso fazer mudanças positivas na cultura institucional e compartilhar isso com o mundo. Eu enxergo três maneiras de fazer isso:
- Dê espaço para quem trabalha com você
Empodere seus funcionários, cada um tem uma história para contar. No mundo das redes sociais, as pessoas estão conectadas e ouvindo outras pessoas, seres humanos reais — e não empresas e marcas que não têm cara.
- Traga os clientes para dentro
Estabeleça um diálogo com os consumidores, coloque-os por dentro dos processos da sua empresa. Eles esperam conversar com você, não apenas ser ouvintes. Faça isso de forma que evidencie ainda mais a cultura interna.
- Mostre ao mundo em que você acredita
Em um cenário onde os consumidores buscam transparência, não basta apenas mostrar a sua marca, é necessário ir além. Compartilhe histórias fortes da cultura interna da sua empresa e deixe os consumidores entrarem em contato com o seu verdadeiro ecossistema.
Essas três abordagens podem se transformar em campanhas poderosas para comunicar com transparência e de forma humana, inserindo sua marca de maneira positiva em uma comunidade que está em busca desses aspectos.
A última década foi marcada pela personalização alimentada pelos dados online. Com as informações dos consumidores em mãos, passamos a servir experiências online únicas, baseadas nas preferências e comportamentos dos usuários que estão cada dia mais conectados à internet. Os consumidores se acostumaram a ter serviços que se adaptam às necessidades deles a um clique.
Hoje, porém, o movimento é de busca por essa mesma personalização no mundo real. Em uma pesquisa da Deloitte sobre tendências de marketing, 75% dos executivos entrevistados disseram que pretendiam entregar mais experiências híbridas para os consumidores, e o objetivo principal para 43% deles era aumentar a personalização.2
Isso acontece porque as pessoas querem serviços, experiências e produtos que se adaptem à medida que a realidade delas também muda. E essa necessidade está presente nos mais diferentes segmentos, como os financeiros, automotivos, ou varejo e serviços.
Aqui não estou falando da individualização para uma pessoa, mas da criação de serviços e experiências que atendam uma comunidade inteira, como lojas físicas que sejam moldadas de acordo com os interesses dos consumidores da região onde ela está.
Ter acesso aos dados das pessoas é uma relação de confiança que pressupõe um serviço contínuo e que atenda às necessidades delas online e, agora, também offline. E, depois de descontos e vantagens monetárias, conveniência é o que os consumidores mais desejam em troca dos dados.3 O que você pode oferecer para o seu cliente?
Além da busca constante por novidades, as pessoas estão, cada vez mais, preocupadas com o efeito das suas ações na sociedade. Elas querem uma forma de consumo que não traga tantos danos ao planeta e que faça do mundo um lugar melhor do ponto de vista social, econômico e ambiental. E as pesquisas mostram que 57% dos consumidores são mais leais a marcas que estão comprometidas a lidar com as injustiças sociais em suas ações.4
Colaborar com outros negócios, inclusive com concorrentes, é algo esperado e apoiado pelo consumidor moderno.
Uma das coisas mais poderosas que podemos fazer com nossos negócios é colaborar.
A pandemia ensinou a todos que juntos podemos ser mais fortes e que alguns resultados precisam ser partilhados entre todos se queremos um futuro melhor. Por isso, os consumidores esperam que as empresas colaborem com outros negócios, inclusive com concorrentes. Seja em relação a dados e soluções de código aberto, seja em relação a novos materiais mais sustentáveis, se algo pode trazer benefícios para os clientes e para a sociedade como um todo, por que não ser dividido e adotado pelas marcas?
Caminhos necessários
Esses quatro caminhos existem para serem colocados em prática, mas são parte de um plano de longo prazo para os negócios. Como segui-los? O início de tudo é entender que se tratam de novas expectativas dos consumidores diante de momentos de mudanças econômicas e tecnológicas.
Cada empresa deve olhar para dentro de seu ecossistema e entender como utilizar, da forma mais verdadeira possível, essas ferramentas para mostrar aos clientes a que vieram e oferecer experiências ainda mais significativas.