Março é o mês do ano em que os debates sobre a questão de gênero ganham força, graças ao Dia Internacional da Mulher, no dia 8. Essa força fica ainda maior quando pensamos no poder que o YouTube tem de amplificar e multiplicar esses diálogos, chegando a uma imensidão de pessoas que se identificam com o assunto e que querem participar da conversa.
Conversamos com três mulheres que fazem sucesso criando conteúdo no YouTube, para nos contar como a plataforma as ajudou a encontrar uma maneira de se comunicar e se conectar com o público. As criadoras também falam sobre os principais desafios que a mulher enfrenta hoje em dia, e como as marcas e empresas podem ajudar nessa luta.
O YouTube é uma folha em branco
Já sabemos que o YouTube é um universo em que criadores e criadoras, por meio do conteúdo que produzem e publicam, desenvolvem uma voz própria e encontram um público feito por pessoas que, entre outras coisas, querem se ver representadas e buscar uma identidade. No caso das mulheres, essa narrativa em primeira pessoa foi um caminho não só para se conectar com quem se interessa pelos mesmos temas, mas também para viver uma autodescoberta.
“O YouTube é uma folha em branco”, diz a criadora Nathalia Arcuri, dona do canal de empoderamento financeiro Me Poupe, que já alcança mais de 3 milhões de inscritos. “Acredito que lá a mulher pode ser quem ela quiser, sem depender de ninguém.”
“Se quisermos reinventar o imaginário em torno da mulher preta, precisamos falar em primeira pessoa, e o YouTube dá esse espaço.”
– Jacy July
No caso da criadora Louie Ponto, o YouTube foi um divisor de águas. Dona de um canal com mais de 480 mil inscritos, no qual debate o feminismo e questões LGBTQ+, ela considera que a produção de conteúdo na plataforma ajudou no seu processo de autoconhecimento.
“O YouTube foi muito importante na minha (des)construção como ser humano, porque entrei em contato com vivências diferentes, com as quais aprendi e continuo aprendendo muito”, ela nos conta. “Percebi que existem outras pessoas com histórias parecidas, que não estamos sozinhas e que é possível a gente construir uma rede de apoio e de carinho.”
O mesmo vale para Jacy July, youtuber que incentiva a autonomia estética e financeira da mulher negra em seu canal, que conta com mais de 230 mil inscritos. Ela vê o YouTube como uma ferramenta capaz de amplificar a voz dessas mulheres. “Se quisermos reinventar o imaginário em torno da mulher preta, precisamos falar em primeira pessoa, e o YouTube dá esse espaço.”
Em cada vivência, um desafio
Mas falar em primeira pessoa sobre o quê? Que temas são mais urgentes ou importantes para entrar em debate? Alguns desafios que as mulheres enfrentam, como a violência, vêm desde muito antes das mídias sociais ou das novas tecnologias. Outros são mais discutidos hoje do que nunca: a valorização feminina no mercado de trabalho, por exemplo, foi um assunto que cresceu junto com o aumento da proporção de mulheres conseguindo empregos fora de casa.
“Ser mulher abarca uma série de possibilidades, e isso quer dizer que possuímos vivências diferentes e que sofremos opressões também distintas”, nos conta a Louie. Ela acha que medidas contra a violência e políticas de saúde pública para as mulheres são prioritárias para atacar problemas como o feminicídio e as mortes em decorrência de gravidez interrompida.
Para Jacy July, o maior desafio da sua geração é representar a mulher negra e da periferia de maneira positiva, com a sua inclusão nos espaços de poder, em cargos de liderança e nas profissões dominadas por quem é privilegiado.
“É impossível falar em igualdade de gênero sem levar em conta raça e posição socioeconômica”, diz. “Precisamos humanizar a mulher preta, desconstruir o padrão feminino hipersexualizado e desumanizado e mostrar a nossa capacidade cognitiva, nossas artes, sentimentos e complexidades. Precisamos criar narrativas sobre nós, por nós e para nós.”
“Uma mulher que trabalha mais de 12 horas por dia é sofredora, maluca e exagerada, mas o homem que trabalha 12 horas ainda é exemplo de profissionalismo e produtividade.”
– Nathalia Arcuri
Nathalia Arcuri também vê o empoderamento feminino passando pelo empoderamento econômico. “Falamos mais hoje sobre a inclusão feminina no mercado e em cargos de liderança do que na época da minha mãe. Mas, apesar das três décadas que nos separam, ainda existe diferenciação salarial”, diz.
Além disso, Nathalia ressalta o peso cultural que recai sobre a mulher quanto à criação dos filhos. Isso não só dificulta o seu avanço no mercado de trabalho, mas também desperta, segundo a youtuber, o preconceito de quem vê uma diferença no peso que a carreira e as tarefas do lar devem ter para ambos os sexos.
“Uma mulher que trabalha mais de 12 horas por dia é sofredora, maluca e exagerada, mas o homem que trabalha 12 horas ainda é exemplo de profissionalismo e produtividade”, afirma.
Marcas e empresas dando o exemplo
Para que a igualdade não seja apenas pauta de conversas, mas também colocada em prática, as criadoras veem as marcas e empresas com um papel central, tendo um poder de viabilizar o empoderamento por meio da emancipação financeira e da inclusão.
Nathalia Arcuri quer ver mais oportunidades e capacitação em mercados em que a mulher tem presença ainda tímida. Além disso, ela acredita que as mulheres em cargos de liderança são uma influência positiva para as demais. “Gerar a identificação através do exemplo positivo é um recurso extremamente poderoso”, afirma.
“Que mulheres são contratadas? Quantas mulheres negras, indígenas, com deficiência e LBT são chamadas pelas empresas?”
– Louie Ponto
Louie Ponto concorda que o empoderamento das mulheres vem principalmente da emancipação financeira, com as empresas e marcas contratando mulheres com o mesmo salário dos homens e promovendo ações contra assédio, abuso e violência. Mas ela pede uma reflexão a mais na questão. “Que mulheres são contratadas? Quantas mulheres negras, indígenas, com deficiência e LBT são chamadas pelas empresas?”
Por mais importante que seja ter um dia ou um mês do ano para gerar consciência sobre a situação da mulher, os desafios citados pelas creators que entrevistamos só podem ser enfrentados de fato quando a ideia da igualdade de gênero for absorvida por todos, o ano todo. Isso precisa ocorrer em casa, com a abertura para o diálogo e uma divisão equilibrada de papéis, nas empresas, com políticas de equiparação de salários e de combate ao assédio, e com as marcas, fazendo campanhas e criando conversas que mostrem que viver em uma sociedade com oportunidades iguais para todos os sexos é o único caminho a seguir.
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