Quanto mais a tecnologia avança, maior é o medo de que a humanidade seja substituída – seja pelo robô original, criado pelo escritor tcheco Karel Čapek, pelo HAL 9000 de 2001: Uma Odisséia no Espaço ou até mesmo pelo Exterminador do Futuro.
Para nós que trabalhamos com propaganda e marketing na era do machine learning e da inteligência artificial, é fácil pensar que estamos em uma disputa de vida ou morte com essas máquinas. Mas acho que essa mentalidade “humano vs. máquina” é um imenso desserviço para nós mesmos e para o nosso trabalho. Ganhamos muito mais quando abraçamos o machine learning para acelerar nosso poder criativo.
Para explorar essas oportunidades, é importante entender o que as máquinas sabem fazer. Primeiro, elas identificam padrões que geram insights e nos mostram possibilidades criativas. Segundo, elas automatizam as nossas tarefas em velocidades e escalas extraordinárias, economizando tempo e melhorando resultados. Por último, elas reúnem conjuntos de dados que podem levar a expressões criativas completamente novas.
Embora cada um desses pontos fortes funcionem para acelerar a nossa criatividade, eles também ajudam a expor as fraquezas das máquinas, e mostram por que os humanos continuam sendo os donos do poder criativo.
Reconhecimento de padrões traz insights
As máquinas conseguem processar rapidamente milhões de vídeos e correlacionar elementos criativos com bastante eficiência. Isso nos ajuda a responder perguntas como: “Será que essa fonte ou essa cor vai funcionar melhor?” Foi assim que nós descobrimos, por exemplo, que os vídeos com flare, aquele efeito em que um facho de luz parece deixar uma “mancha” na imagem, atingiu seu máximo da popularidade em 2013 e, portanto, é melhor evitar essa opção estilística.
Esse tipo de análise não envolve muita perícia; é mais uma aplicação massiva de algo chamado de identificação de elemento básico. É por isso que Ben Evans diz que o poder do machine learning é como ter “estagiários infinitos”: é uma capacidade imensa, mas sem experiência. Por isso, com certeza não devemos vê-lo como uma solução rápida e fácil para criar anúncios incríveis.
Mesmo que as máquinas consigam reconhecer padrões, a inteligência humana ainda é necessária para classificá-los e aplicá-los.
Imagine que você analisou centenas de anúncios do YouTube e identificou um fator muito ligado à eficiência. Um exemplo: os anúncios de melhor desempenho foram filmados em salas de estar. Qual é o seu próximo passo? Produzir todos os filmes seguintes em salas de estar? Ou editar todo o seu material bruto para incluir mais salas de estar? Nenhuma dessas opções vai melhorar o seu desempenho automaticamente, é claro. Mesmo que as máquinas consigam reconhecer padrões, a inteligência humana ainda é necessária para classificá-los e aplicá-los.
Mais resultados com inteligência automatizada
A automação também simplifica partes do processo criativo, garantindo rapidez e eficiência. Um exemplo é explorar centenas de títulos junto a públicos diferentes para encontrar as melhores combinações. Em vez de perder meses ouvindo grupos focais entediados debaterem duas ou três variações, ferramentas à base de machine learning podem revelar a melhor combinação usando dados pré-existentes, sinais de audiência e uma biblioteca de assets.
As peças para construir esse processo já existem. As marcas estão tendo sucesso usando sinais robustos de audiência e ferramentas como o Director Mix (conhecida no Brasil como Vogon), que usa recursos básicos de vídeo para criar milhares de versões adaptadas para diferentes públicos-alvo. Recentemente, o grupo de hotéis e cassinos Caesars Entertainment usou a ferramenta para criar e distribuir mais de 150 variações de anúncios e melhorar a percepção da marca. (Leia o case em inglês aqui.)
Permitindo novas formas de expressão criativa
Se essas oportunidades já são impressionantes, pense no potencial quando as máquinas aprenderem a responder perguntas ainda mais complexas – como o tipo de histórias que devemos contar, e para quem.
Por exemplo, imagine se máquinas nos contassem que narrativas são mais eficientes para atingir diferentes metas? E se elas pudessem nos dizer em que velocidade as tendências mudam? Desse jeito, é mais fácil entender o que é um simples modismo e o que veio para ficar. Imagine ainda um mundo, no qual as máquinas possam revelar as perguntas que nem sabemos que podemos fazer. As possibilidades são infinitas e aterradoras.
Onde os humanos sempre vão ter vantagem
Máquinas – nossos estagiários infinitos – claramente têm um potencial único para ajudar. Mas tudo tem limite.
O machine learning funciona com tarefas que exigem níveis baixos de processamento. E nós, que trabalhamos com publicidade e marketing, podemos usá-lo para aperfeiçoar nosso trabalho e economizar tempo. Mas precisamos reconhecer que isso ainda é uma parceria. A máquina está otimizando um conjunto de variações, mas não está planejando uma campanha ou escrevendo um anúncio do zero.
Um grande exemplo disso é a campanha de Dia dos Namorados veiculada pela Lacta esse ano, que quis gerar interesse no produto e no vídeo “The Taste of Love”. Usando anúncios TrueView com indicadores de contexto, a marca convidou os usuários a enviarem fotos para um site da campanha. Depois disso, usaram o machine learning para analisar e organizar as fotos em representações comuns de amor, como “beijo”, “sorriso” e (como não poderia faltar) “cachorro” e “gato”. Os usuários podiam explorar os conceitos que melhor representassem o sentimento ao visitar uma experiência interativa online.
As máquinas são parceiras que nos ajudam a acelerar nossa criatividade e a explorar as possibilidades com mais profundidade do que nunca.
A abordagem da Lacta deu certo ao incentivar o interesse na marca, e mostrou algo importante: as máquinas conseguem analisar, organizar e viabilizar uma abordagem nova para a campanha, mas elas não conseguem criar a campanha ou trazer insights e elementos emotivos para as pessoas se conectarem. Só humanos conseguem fazer isso.
Assim, enquanto a tecnologia continua avançando, contenha os seus medos distópicos. Em vez disso, abrace a ideia de que máquinas são parceiras que nos ajudam a acelerar a nossa criatividade e a explorar as possibilidades com mais profundidade do que nunca.